terça-feira, 27 de abril de 2010

Acção Social no Ensino Superior: a palavra das Residências Universitárias

A carta aberta da Plataforma das Residências Universitárias contra as cauções.

É do conhecimento comum que a origem dos problemas da Acção Social no Ensino Superior é dúplice: o sub-financiamento estatal e a burocratização dos Serviços de Acção Social (SAS). De entre outras dificuldades despoletadas, aqueles problemas acentuam-se quando nos centramos no tema da degradação das Residências Universitárias (RU) dos Serviços de Acção Social da Universidade de Coimbra (SASUC).

Com o objectivo de contribuir para a resolução destes problemas, quando muito para os dirimir, um grupo diversificado de estudantes, das RU, bolseiros, gente anónima que se solidarizou com a causa, fez nascer um movimento social, assumindo o compromisso da defesa de valores que julga essenciais. Assim, nasceu a Plataforma de Residências da Universidade de Coimbra.

É certo que o sub-financiamento e a burocratização, são, em grande medida, problemas alheios aos SASUC. Acontece que todos os SAS têm ao seu dispor um importante espaço discricionário, através do qual, mediante os problemas/necessidades concretos, podem regular a sua organização interna de forma a atenuar aqueles problemas/necessidades. É esse o caso do pagamento da Caução de 50 Euros como requisito de acesso/atribuição às RU dos SASUC, instituto criado e aplicado durante este ano lectivo.

Do nosso contacto com os colegas das 13 Residências, ressaltaram vários problemas.

1- Desde logo um problema/argumento de princípio. Comparar a Caução imposta pelos SASUC, com a Caução exigida pelo Regime de Arrendamento Urbano, parece-nos ilegítimo. Tratam-se de relações “contratuais” completamente diferentes. O fim almejado por este “contrato” não é o da satisfação do interesse do arrendatário ou do inquilino. A relação entre os SASUC e estudantes das RU assenta num vínculo de solidariedade e o fim em vista é, pois, um fim social.

2- Se o fundamento da Caução é o de prevenir a falta de pagamento de danos patrimoniais eventualmente causados nas RU, parece-nos bastante questionável que a prévia coacção financeira sobre estudantes carenciados seja o melhor remédio...

3- A forma precipitada da aplicação do instituto da Caução, sem auscultação consistente dos delegados das Residências, merece a nossa censura vil.

4- Problemas decorrem igualmente do tempo e da forma de pagamento da Caução. Será justo exigir o pagamento da Caução durante o mês de Setembro, quando nem sequer foram atribuídas/pagas as bolsas de estudo (sendo certo que esse atraso não é da responsabilidade do estudante-bolseiro)? Qual a razão para a inflexibilidade da forma de pagamento da Caução? Porquê o pagamento maioritário em dinheiro e as raras excepções do pagamento por multibanco ou cheque? O que é feito, durante o ano lectivo, aos cerca de 50 mil Euros resultantes do pagamento de cauções dos estudantes das RU? Como se não bastasse, verificaram-se ainda alguns problemas nos registos de pagamento dos SASUC quanto às pessoas que tinham ou não pago a Caução, tendo sido os SASUC obrigados a enviar emails para todos os estudantes.

5- Estando as RU bastante degradadas, de que forma se estabelece a barreira entre a culpa (dolo e negligência) ou o mero dano patrimonial resultante daquela degradação? Há um processo de averiguação definido com todas as garantias asseguradas?

6- Se mais argumentos não existissem, o instituto da Caução foi aplicado sem que estivesse previsto no respectivo Regulamento...

Para além do meio milhar de assinaturas recolhidas numa petição contra o pagamento da Caução como requisito de acesso/atribuição de RU, esta Plataforma, por força dos seu crescimento e do cariz frutífero dos seus contactos nas múltiplas Residências, está hoje em condições de apresentar um modelo alternativo para a prevenção e cobrança dos eventuais danos patrimoniais causados nas RU.

Neste sentido, propomos que à semelhança do que sucede com o pagamento da renda mensal das RU, o estudante assine um documento, através do qual autorize os SASUC a descontar da bolsa de estudo, o valor equivalente ao dano provocado, mas apenas ao estudante infractor, no momento da prática do delito e na medida do prejuízo causado. Uma vez provocado o dano, seguir-se-ia uma fase de instrução, célere mas justa, onde fossem concedidas todas as garantias às partes e que permitisse alcançar a verdade e, por consequência, ressarcir os SASUC. Tratando-se de estudantes carenciados, pode acontecer que os danos provocados pelo infractor sejam de tal maneira elevados que o pagamento imediato e total dos estragos dificulte desproporcionalmente a situação sócio-económico do colega que comete o delito. Por isso mesmo, propomos que neste tipo de casos seja concedida a possibilidade de se proceder a um pagamento faseado dos danos causados, para que a carência efectiva do colega infractor não o impeça de pagar os estragos provocados e, concominantemente, lhe permita durante o tempo em que deve saldar a dívida viver sem grandes constrangimentos financeiros. Assim se garantirá não só o saldar das dívidas, bem como a justiça. Os danos patrimoniais seriam pagos, satisfazendo a pretensão dos SASUC, pelo estudante que os provocou, no momento em que os causou e na medida dos prejuízos existentes.

A petição contra o pagamento da Caução, constitui apenas a primeira fase do movimento social criado pela Plataforma de Residências da Universidade de Coimbra. Já em Maio está prevista a entrega ao Administrador dos SASUC de um Caderno de Reivindicações que, de forma detalhada, especificará as principais carências das 13 RU dos SASUC. É esta a natureza da nossa intervenção cívica e política. Construir maiorias sociais capazes de pressionar a transformação da nossa realidade.

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